Quantos de nós já ouvimos o que é a Solidão? E, quantos de nós vivemos em Solidão, mesmo tendo namorado, marido, ou simplesmente a partilhar a casa com alguém?
Para quem começou a ler agora o meu blog, sou gay e vivo sozinho. Não tenho animais de estimação por opção. Sim, vivo sozinho e não preciso de ter um cão para não ter medo...
Até aqui tudo bem. O dia de hoje tinha tudo para ser um dia como tantos outros. Com os stresses de um dia normal na "vida dos elevadores e no Call Center".
Esta manhã, falo com uma senhora super simpática ao telefone. Agendo uma reunião para as 11h em Alvalade. Ao chegar ao prédio em questão tenho um "flash" de já ter ali estado há muitos anos atrás. Sou recebido por uma senhora já de idade, muito simpática que me convida a entrar para a sala. Tinha preparado um chá com uns bolinhos de canela.
De repente começo a ouvir uns gemidos de dor, de angustia mesmo...
Senhora: - Peço imensa desculpa, é o meu filho que está acamado.
Quando entro no quarto, vejo um homem magro que deve pesar uns 20 a 30 Kg. Os nossos olhos cruzam-se e eu viajo até ao ínicio dos anos 90. Aqueles olhos verdes e aquele sorriso, trouxeram-me a recordação do João Pedro. O João Pedro era mais velho que eu uns 5 a 6 anos. Estava a estagiar para ser juiz. Naquela altura eu gostei muito dele, mas depressa percebi que ele "era muita areia para a minha camioneta"... Para ele, apenas devo ter sido uma queca como tantas outras.
Aproximei-me dele e estiquei-lhe a mão e disse:
Francisco: - Bom Dia, sou o Francisco
João Pedro(numa voz pouco perceptivel): - Bom Dia, a tua cara não me é estranha. Creio que nos conhecemos há muitos anos atrás. Não moravas para os lados de Benfica?
João Pedro:
O João Pedro namorou 10 anos com um rapaz, que a mãe adorava. Numa viagem a caminho do Alentejo. O namorado e o João Pedro tiveram um acidente de carro. O João Pedro ficou tretaplégico(da cintura para baixo), o namorado saiu ileso. O namorado não aguentou a pressão e aos poucos foi se afastando... O João Pedro devido à situação de estar numa cadeira de rodas e com o fim do seu relacionamento, o rapaz teve um AVC e está paralisado do lado esquerdo. Como se isto não bastasse, apareceu-lhe um tumor no pâncreas. Está deitado à espera que a morte chegue...
Quantos de vós, ficaria ao lado do vosso companheiro numa situação destas?
Depois do Almoço recebo o telefonema de uma amiga minha:
Teresa: - Francisco! Podes ir beber um café comigo, dentro de meia-hora? Amanhã embarco para a Filândia...
Francisco: - Claro que posso. Aproveito e vou buscar os bilhetes à agência de viagens. Amanhã, vou para Marrocos...
Encontrámo-nos no nosso café habitual, "me and you".
Teresa: - Vais com quem?
Francisco: - Vou com o Gonçalo. Um miudo lindissimo, vais gostar de o conhecer. E, tu vais com quem?
Teresa: - Sozinha...
Francisco: - Como assim?
Teresa(com um sorriso): - Tenho um cancro na cabeça. Deram-me 4 meses de vida. Não vou fazer tratamentos, porque não existe cura. Não me vou "queimar" para ter mais uma semana de vida. Escolhi a Filândia para estar sozinha e poder encontrar-me comigo própria neste ultimos meses que me restam...
Passei o resto da tarde sentado a ver o rio na zona da expo.
5 comentários:
boa merda. é por isso que não devemos perder tempo com merdas nesta de vida. é aproveitar, comprar uns bilhetes à maluca para dois, e ir passar um fim-de-semana noutro continente. e ser feliz.
Bem...
isto é meter a foice em seara alheia... mas vá lá!! Ao juntar o que acabas de contar, não passou duas semanas que morreu um rapaz da terra, de 20 e tal. Foi diagnosticado cancro, e em três meses a coisa ficou feita: descoberta; tratamento; morte. Depois do choque, a dor da incompreensão, trauma por pensar que a vida não é nada do que imaginamos. E não é mesmo... a cultura de hoje, as ideias, não estão viradas para o homem como tal, com a sua história natural. Estão direcionadas para si, para um melhor nível de vida, que muitas vezes acaba por ser um fim antecipado a todos os níveis. Quando damos por tudo isto, a queda do suposto "bom" para o real do "agora" antecipa sentimentos de todos os tipos. Aí, penso, só nos resta sentar, ou escolher ficar só.... pensar!
Claro que falar é fácil... sim!!! Muito... mas tenho interrogado acerca disto, destas histórias que surgem na nossa família, com amigos. E se fosse comigo? não sei.... mas tenho para mim cada vez mais a ideia de preparação para essa realidade que não está assim tão longe de nós, como julgamos. O que for e quando for, desejo estar sereno, tranquilo. Aborrecer-me por morrer quando é a minha, nossa, natureza, seria "desnaturalizar". Falando mais claro, apetece dizer que apesar de tudo não posso largar aquilo que sou o que tenho e julgar a vida pelo lado negativo... fui e serei humano!
Se tivesse oportunidade de falar com a Teresa, mais que palavras, seria apenas um abraço de respeito por alguém que sofre e que se prepara para uma mudança na sua vida.
Como nascer é preciso também saber morrer!
Olha, Francisco, é melhor não dizer nada...
Nos últimos tempos têm sido vários os casos semelhantes aos que aqui descreves, com pessoas quer da família, quer de amigos, que eu acho que devemos ser realmente egoístas e viver o mais que pudermos e o melhor que possamos.
Vai para Marrocos, diverte-te e goza a vida, por favor.
Se pudesse dar um beijinho à Teresa, seria muito bom; não resolvia nada, eu sei...mas era bom.
Speedy, Se7e e Pinguim,
Muito obrigado pelas vossas palavras de apoio e de reconforto. Perante algumas situações que acontecem na nossa vida, somos mesmo impotentes.
O meu Bem Haja
Forte Abraço x3
Olha, não há palavras. Às vezes queixamo-nos da nossa vida, mas a vida pode ser muito madrasta mesmo.
Em tudo na vida, nas várias situações que vou vivendo ou com que tenho contacto procuro extrair algum conhecimento ou aprendizagem (o teu blog é um bom exemplo). Não vivo numa lógica de carpe diem, mas tento que cada minuto da minha vida não seja em vão e que tenha algum significado para mim e para os outros, por isso acho fantástico o facto de fazeres voluntariado (eu também faço).
Um abraço
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