O Pinguim lançou desafio aqui na Blogesfera, para que cada um de nós contasse a nossa primeira experiência. Este post é uma cópia de um post feito aqui neste canto a 27 de Dezembro de 2010...
Naquela data, este post foi como feito como uma resposta a uma questão feita pelo seguidor e comentador Myke. Ele questionou-me acerca de como eu me sentia a reviver este "Filme"
Aqui fica o post daquela altura:
O filme é a minha história com o meu primo Cândido. Uma história como tantas outras. Creio que finais felizes, só mesmo em filmes de comédias românticas, ou então nas raríssimas excepções. E, ainda bem que existem essas excepções. Que pena serem tão poucas, as excepções...
Nesta altura ainda somos novos, sem grande conhecimento desta "putice" do mundo gay. Um mundo de muito Amor e uma cabana. Um mundo cheio de encantamento, um mundo cheio de promessas, do querer Ser Feliz para sempre. Construir uma vida a dois, onde tudo é belo...
Confesso que já não me recordo muito bem de como tudo aconteceu. Ainda era uma criança. Vamos por partes. Não Blog Liker, não vou fazer um post por cada parte. Não vou ser assim tão mauzinho. Desta vez não....
Depois do cândido ter caido da oliveira abaixo. Naquela altura não havia medicamentos como nos dias de hoje. Havia alcóol, mercúrio(qual betadine). Uma farmácia a 15km no mínimo, um hospital a outros tantos kms. Toda a medicação era à base de "mezinhas" da avó. Mezinha é o uso tradicional da medicina. Só em casos gravíssimos é que as pessoas iam para o hospital. Nada como nos dias de hoje. Um puto espirra, e a mãe leva-o às urgências.
Como o rapaz saiu ileso da queda e era inteligente. Enganava-me à força toda. Todos os favores pedidos eram favores concedidos. LOL
Como ir buscar um brinquedo, um copo de água. Nada de sexo, suas mentes perversas...
Já não me recordo do porquê de uma noite, dormimos na mesma cama. Até lá dormíamos no chão. As crianças dormiam sempre no chão, os adultos é que ficavam sempre nas camas. Talvez fosse uma iniciação ao campismo...
Nessa noite, senti a mão do Cândido a tocar-me e ele sussurrou-me ao ouvido:
- Vais ver que gostas...
Não houve beijos. Apenas o toque das mãos e depois o toque das pilas e mais tarde sentir algo húmido em cima da minha barriga. O Cândido deveria estar com 11/12 anos. Eu creio que nem esporra tinha nessa altura.
Para mim, o mais importante era a importância e a atenção que o Cândido me dava. O tempo que passávamos juntos, as brincadeiras em conjunto. Estávamos sempre juntos, quer estivessemos na casa da avó, ou em Lisboa. O nosso mundo eram só estes dois locais. Não havia Internet para ver o mundo de outra forma...
Quando as férias acabaram, no regresso a casa. Eu senti-me mal. Passei a viagem toda a vomitar. Fui parar ao hospital(Não me recordo deste episódio. Foi-me contado pela minha mãe e pelo Cândido).
Só me recordo de ter acordado no Hospital com um tubo ligado ao pulmão. Tinha apanhado uma bronque-pneumonia. E não me recordo da Pluresia. Recordo-me de estar internado e de ter muita sede. Sempre que pedia água, lá vinha um rapaz oferecer-me água. Era o Cândido. O moço tinha fugido de casa, para me fazer companhia. Ele fugia da escola no intervalo para me ir ver ao hospital. Imagino as tareias que deve ter levado do pai, da mãe e da professora. Ele nunca se queixou...
Como vivíamos no mesmo prédio. Ele no r/c e eu no 1º andar. Quando voltei a casa, ele deixou de fugir na escola. Assim que chegava a casa, largava as coisas em casa e subia as escadas para almoçar comigo e para fazer os trabalhos de casa dele e os meus. Frequentávamos diferentes escolas, porque enquanto eu andava na primária, ele já estava na preparatória. Mas, ele ia falar com a minha professora por causa dos meus trabalhos de casa.
Uma noite estava em casa, lembro-me de ter começado a vomitar. E, acordo outra vez no Hospital. Devo ter sido o utente nº1 daquele hospital nos finais dos anos 70, princípios dos anos 80.
Fiquei a saber mais tarde, que o Cândido tinha dormido lá em casa. Como era hábito. Ele acordou com o barulho dos meus vómitos. Ele foi a correr acordar a minha mãe e o meu pai. Como só o meu pai é que tinha carta de condução. A minha mãe levou-me ao colo e na outra mão ia o Cândido. Foram a pé desde a estrada de Benfica até ao hospital de Santa Maria. Como eu já era um pouco pesado. Uma parte do caminho, fi-lo ao colo da minha mãe, a outra parte fi-lo às "cavalitas" do Cândido.
Eu soube mais tarde, através do Cândido. Quando ele foi acordar o meu pai e a minha mãe, o meu pai disse: - Amanhã vou trabalhar cedo, o miúdo vai morrer mesmo um destes dias.
Creio que tinha apanhado hepatite B. Naquela altura, apanhar hepatite B, significava morte, em muitas vezes dos casos...
Não me recordo de quanto tempo estive internado no hospital. Sei que podia morrer a qualquer momento, porque as minhas visitas passaram a ser limitadas. Só eram permitidas aos meus pais. Naquela altura, nunca tive tantos pais e tantas mães. Todos os meus tios eram os meus pais, e as minhas tias as mães. Até a minha avó foi barrada na entrada para o meu quarto. Havia uma benovolência por parte de alguns/as funcionários/as e enfermeiros/as.
A imagem nítida que eu tenho. Foi a de um enfermeiro a sorrir, me disse:
Enfermeiro: - Francisco! Vá à janela, acenar um olá. Lá em baixo está a sua avó e o seu primo.
Salto da cama, corro para a janela. Vejo a minha avó e o Cândido lá em baixo a acenarem para mim. Naquele momento poderia ter morrido. Teria morrido em paz e feliz...
Mais tarde, voltei para casa. Ainda não tinha sido desta que tinha morrido. Ainda não tinha chegado a minha hora. Alguns dias depois volto a ser internado no hospital.
Quando me deram alta. A minha mãe decidiu levar-me a um "Bruxo". Nesta última entrada, comentei com alguém que eu estava a ver pessoas no meu quarto. Eu via rostos de homens ao fundo da cama, e pessoas deitadas ao fundo dos meus pés na cama.
Não sei se eram sonhos ou realidade...
Fui a Viseu, estive lá uma semana. Ia todos os dias ao consultório do Senhor. Tomei não sei quantas coisas, ouvi não sei quantas rezas. Mais tarde, soube que ele me tinha "fechado o cofre".
O lado Esotérico da coisa: O "cofre" pode estar aberto ou fechado. Se estiver aberto, as pessoas podem ver espíritos que já partiram, ou então, as pessoas podem ouvir vozes.
Se estiver fechado, tanto melhor. Deixamos de ser considerados "loucos/doidos" varridos.
Quando regressámos a casa, depois de uma semana de tratamentos. A minha mãe, estava de rastos. Segundo ela, passei a semana toda a vomitar e sei lá mais o quê. Não me recordo. Toda a família estava lá em casa. Os espelhos foram retirados de casa. Deixou de haver espelhos lá em casa. Eu reparei que os meus familiares estavam com uma cara de admiração por eu estar vivo. Só podia ser isso...
Até que o Cândido, comentou:
Cândido: - Estás todo inchado. Isso não é gordura. Estás mesmo inchado.
Nos dois meses seguintes, não fui à escola. O Cândido também nunca me deixou ficar de férias. Trazia-me os trabalhos todos os dias. Ele estudava comigo.
Um dia, estávamos a ver o "Dallas", o Bobby dá um beijo na boca da Pam. Olhámos um para o outro e repetimos o que víamos. O nosso primeiro beijo, não correu lá muito bem. Com o tempo, foi melhorando substancialmente...
Com os beijos, vieram os toques das mãos, os apalpões, as punhetas, os primeiros broches, e por fim a penetração.
Engraçado, quando somos jovens e inexperientes, tudo acontece naturalmente. Não existe aquela máxima do "Toma lá, dá cá". Não existe o activo ou o passivo.
Naquela altura surgiu a doença do HIV, que as pessoas morriam ao final de seis meses. E, então? Eu poderia morrer no minuto seguinte...
Não me recordo que idade tinha, quando fodemos pela primeira vez. Deveria ter uns 13/14 anos. Porque estávamos nas férias do verão, em casa da minha avó. A primeira penetração até que foi muito boa, não me doeu nada. Ele era mesmo muito meigo. Ele tinha um pau jeitoso e não me magoou nada. Quando fui eu a penetrá-lo, creio que ele teve algumas dores, mas aguentou-se muito bem.
O Amor tem destas coisas. Quando amamos, o prazer do outro é que é o mais importante.
Como éramos tão jovens, o conceito de namorado não existia. Quando estávamos juntos, brincávamos à carica, ao berlinde, ao pião, aos índios e cowboys, à apanhada. Estávamos sempre acompanhados pelos irmãos ou por outros primos. Não fodiamos todos os dias, nem dávamos beijos todos os dias.
Por norma, os beijos ou algo mais, surgiam: - Se um de nós estivesse sozinho em casa. Se eu de nós, se despia para trocar de roupa ou para ir tomar banho. Aí a tentação era maior.
O meu primo João casou no mesmo dia em que o Cândido fazia anos. A 28 de maio de 1987. Eu iria fazer 17 anos e o Cândido nesse dia, fez 19 anos. Uma grande festa de família, mais um casamento na família. Primeiro são os casamentos, depois os Baptizados e mais tarde os funerais. É, assim a vida...
Nesse dia, uma prima da noiva. Uma gaja mais ou menos gira, "fez olhinhos" ao Cândido e começaram a dançar. A meio da dança, surge um beijo e depois outro...
Senti tantos ciúmes. Que raiva. Ter que partilhar quem amamos com outra pessoa. Seja gajo ou gaja. Creio que a dor, deve ser idêntica para quem ama...
No dia seguinte, lá estava o Cândido à porta de minha casa. Pediu-me não sei quantas desculpas. Explicou-me que tinha feito o que fez, por causa da pressão que estava a começar a sentir em casa. Nesse dia, sentiu uma grande dor de cabeça.
Eu pensei que era uma desculpa para me dar um beijo de arrependimento.
Já não me recordo o porquê. Sei que depois do casamento do meu primo. Os meus tios foram levar a minha avó para casa dela. Que nós os dois fomos também e lá ficámos. Não sei, se ambos tínhamos transitado de ano e dessa forma, não precisávamos de continuar a ir à escola.
Tenho poucas recordações e imagens do que aconteceu a seguir. Lembro-me de um dia, termos ido pastar as ovelhas e as cabras. Levámos o almoço que a minha avó tinha preparado. Estava um dia lindo, quando de repente a conversa foi parar à morte. Essa conversa fez, que nós ao chegarmos a casa, fossemos colocar as nossas iniciais no fontanário, para perpetuar o nosso amor no tempo...
Nessa noite, depois do jantar fomos para debaixo de uma figueira que existia por trás da casa da avó. Estava uma noite linda. O céu estava completamente estrelado, e o tema foi: - "SE EU MORRER PRIMEIRO"...
- Serei o canto do rouxinol ao teu acordar;
- Serei o primeiro raio de sol, que te despertará;
- Serei a tua primeira gota de água, que tocará o teu corpo;
- Serei a primeira flor que vires a caminho da escola;
- Serei a primeira gota de chuva que vires ao cair;
- Serei a primeira folha que cairá no Outono;
- Serei o primeiro Gaio, que ouvirás da parte da tarde;
- Serei o cheiro da terra molhada, que pisares;
- Serei o cheio da primeira flor, numa manhã primaveril;
- Serei a primeira estrela, no cair da noite;
- Serei a primeira luz do Luar, que te iluminará o cabelo;
- Serei a Estrela mais brilhantes, que vires no Céu. Ali estarei eu sempre à tua espera...
Recordo-me nos dias seguintes, o Cândido queixar-se de dores de cabeça. Qualquer barulho, parecia que lhe rebentava os ouvidos. Muitas teorias surgiram, como as dores de dentes, otites, cera nos ouvidos, ter estado a ouvir musica a noite inteira. Ele foi parar ao hospital e eu fiquei em casa. Eu não o acompanhei...
Ele ficou internado a fazer exames médicos, e eu só o fui ver uma única vez...
Fiquei a saber que os meus tios tinham ido para a Alemanha. Os médicos na Alemanha eram melhores que os médicos portugueses. Toda a família mentia, incluindo a minha avó. Eu acreditei, nunca procurei a verdade...
No dia de aniversário do Cândido, a 28 de Maio de 1988. Eu liguei para a Alemanha, e o meu tio do outro lado diz-me:
Francisco: - Tio! O Cândido está melhor? Quero lhe dar os Parabéns(Eu estava super feliz nesse dia)...
Tio: - Por Favor Francisco! Se quiseres dar os parabéns, liga para o cemitério. O Cândido já morreu.
Desligou-me o telefone na cara.
Eu estava com 17 anos, a caminho dos 18 anos. Sempre pensei que o Cândido tinha seguido a sua vida e que nunca quis falar comigo. Estávamos em países diferentes. Vidas diferentes. Ao longo daqueles meses, a minha avó tinha virado uma contadora de histórias acerca do modo de vida que o cândido estava a ter na Alemanha.
Quando a confrontei com as palavras do meu tio. A resposta foi: - Um dia conto-te a verdade, e esse dia nunca chegou...
Nesse mesmo ano, entrei em acompanhamento psicológico e o tema da homossexualidade foi abolido do meu dicionário. Fechei-me para o mundo e para a família, nessas questões.
4 comentários:
Caramba. Isso é mais do que a tua primeira vez. É uma histórias de amor lindíssima.
E se não é perguntar demais, nunca soubeste o que aconteceu de facto?
Sad Eyes,
Tenho "algumas luzes". A carta foi rasgada e deitada para o lixo. Com ela foi tudo o que poderia estar e não estar escrito :S
Abraço
Na altura o meu comentário foi este:
"Nem sei que dizer...
Li tudo de uma só vez, sôfrego. Que história, tão bela e ao mesmo tempo tão triste.
Obrigado pela partilha."
Agora quase que o repetia e o quase é por duas razões: por já a conhecer e porque tenho que acrescentar um outro obrigado, que foi dares seguimento à sugestão do meu post.
Abraço grande.
Pinguim,
Eu aceito todos os desafios e sugestões, afinal a blogueesfera é mesmo a partilha de cada um...
Já dizia a minha avó:
Se cada um de nós tiver uma ideia, logo, cada um de nós passa a ter 2 ideias...
:)
Abraço
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